30 junho 2006

Julho

Vai começar o meu mês preferido. Aquele em que o Verão é mesmo Verão, em que se ouvem cantar alto as cigarras, em que as noites começam de dia e os jantares são de salada e fruta comida com apetite.
Adorava Julho durante a adolescência. Férias que nunca mais acabavam, ir para a praia até ficar torrada, escrever as saudades da paixão desse momento no meu diário e adormecer de janela aberta, com as estrelas gravadas nos olhos, para acordar cheia de vontade de passar mais um dia a fazer todas aquelas coisas para as quais nunca tinha tempo.
Já não me lembro da última vez que pintei um quadro.
Que apanhei o combóio para ir para a praia com os amigos.
Que fiquei a ler até de manhã alguma coisa inelargável que tinha comprado na última Feira do Livro.
Que contei os dias para rever um qualquer rapaz da escola.

Eu própria já reconheço que ando excessivamente nostálgica. Acho que não paro de reviver o passado enquanto não viver o futuro que desejei naquela altura. Alguém sabe, de facto, viver o presente?

27 junho 2006

batalha interior

Acho que o meu corpo está a travar uma batalha interior e não sei contra o quê. Tenho uma febre baixinha mas insidiosa, que me faz arfar, acelera o coração e dá-me arrepios, mas não é suficiente para ficar em casa a ver a Fox todo o dia sem sentimentos de culpa.
Terei comido qualquer coisa que não devia? Haverá qualquer coisa a comer-me por dentro? Estarei apaixonada? Seja como fôr, hoje arrasto-me pelo trabalho, não vendo a hora de chegar a casa, fazer de conta que é Novembro, e enrolar-me nos cobertores com o meu chá de cidreira e a Oprah.

26 junho 2006

penúria

É ir passear para Belém e levar de casa uma caixinha de pastéis de nata oferecidos no dia anterior (e uma embalagem de canela).

Mas passeou-se. E descansou-se. E namorou-se. E os pastéis estavam óptimos!

23 junho 2006

baby sitting fora do tempo

Os meus pais andam de férias a passear de carro pela Europa, os grandes malucos, e eu fiquei a tomar conta dos 'miúdos'. Está certo que o meu relógio biológico até já está a ficar sem pilhas de tanto tocar, mas levar logo com dois matulões, que deixam a roupa espalhada, a louça suja por todos os lados, como se tudo se arrumasse e limpasse milagrosamente, e nem sequer se lembram de levar o cão à rua também é um bocado demais!
Sendo assim, peço a minha demissão. Acho que vou abandoná-los à sua sorte e zarpo para a minha casa, mesmo que isso signifique tomar banho de água fria e encomendar pizza todos os dias.

20 junho 2006

rebuçados diamante

Agora que ando a brincar às pessoas crescidas foi com um misto de alegria e saudade que ontem andei a percorrer a zona da minha adolescência. É engraçado como só as velhinhas parecem as mesmas porque as lojas mudaram todas e os miúdos que passam para o liceu são bem diferentes dos meus amigos e colegas (têm piercings e usam mochilas pingonas, ao passo que nós usávamos calças de ganga justas e andávamos com os dossiers forrados na mão), à excepção dos ténis All Stars. Quando vi, exactamente na mesma esquina, o senhor que, no Inverno, vende castanhas e, no Verão, vende gelados, não contive o sorriso e fiquei com vontade de lhe dizer

ainda bem que aqui está
o mundo dá voltas mas há coisas que ficam
espero que ainda venha aqui comprar castanhas com os meus filhos, quando andar às compras para o Natal, sob as árvores com a iluminação mais bonita de toda a Lisboa

Mas continuei a andar e fui até a uma pastelaria daquelas que também continuam fiéis ao que eram há 15 anos. Os empregados são os mesmos, com as suas camisas de manga curta abotoadas até cima. As vitrines revelam bolos de aniversário, miniaturas (no Natal, bolo-rei) e sortido de bombons. As prateleiras de vidro nas paredes têm, de baixo para cima, como numa hierarquia de idades, ovos Kinder, pastilhas elásticas, chocolates, cigarrilhas e garrafas de whisky. Nos balcões, para além dos folhados, bolos e fatias de salame de chocolate, há taças com rebuçados de fruta, caramelos, flocos-de-neve e rebuçados diamante.
Já não me lembrava dos rebuçados diamante, aqueles lindos, coloridos e translúcidos, que se espalhavam pelas mesas de aniversário e eu colhia sorrateiramente (só os vermelhos, os meus preferidos). Devia ter comprado uns ontem, para espalhar todos os dias sobe a mesa da sala da minha nova casa. Ou então não, porque os cães ainda os apanhavam e chamavam-lhes logo um figo.

16 junho 2006

coerência sazonal

Fico fascinada com a quantidade de pessoas que, nos últimos dias, têm saído à rua com guarda-chuva. Está certo que tem chovido. É verdade que, na quarta-feira, estive 15 minutos na saída do Metro, à espera que desligassem as torneiras do céu, e acabei por apanhar uma bela molha. Mas será que mais ninguém sente que há algo de muito estranho em carregar um guarda-chuva em Junho, em Portugal? Se ficassem 13 graus também iam voltar a usar blusões de Inverno?
Não é teimosia, a minha cabeça precisa de ordem. Diz que agora é quase Verão. Se chover, molho-me (nem sequer está frio, de qualquer forma)!
É o gesto de acordar de manhã e pensar: "Umm... Será que devo levar o guarda-chuva?" que me fascina. Ou vivo num universo pararelo ou não quero mesmo saber se fico com o cabelo numa desgraça e as sandálias ensopadas.

14 junho 2006

santo antónio

Depois de tanto trabalho, estava a ver que não aguentava o que é, desde há uns anos, um marco obrigatório na minha vida: a festa do Santo António. Mas não, lá botei as mãos à cintura, abanei a anca para trás e para a frente, e desci do Marquês de Pombal até Alfama. Este ano, estou indecisa se o ponto alto foi: 1) quando consegui que a Lili Caneças me acenasse; 2) quando falei pessoalmente com um assistente do Grande Mestre Professor Mamadu, que me assegurou que este era um Mestre com Muita Força, que podia resolver todos os meus problemas (será que faz macumbas para passarmos na inspecção do gás?); 3) ou quando passei pela maior concentração de urinadores em público de que há memória (junto ao castelo, alinhados qual pelotão de fusilamento, indiferentes às centenas de pessoas que passavam).
Enfim, como sempre, a animação foi grande, com farturas, bifanas, sardinhas assadas, sangria (sobretudo entornada sobre mim), bailarico e, como não pode faltar, o meu momento de homenagem ao Santo António, cada vez mais complicado devido à quantidade de miúdos quase à bulha para apanhar as moedas que as pessoas atiram. Para o ano há mais!
Fica ainda para a história a primeira noite que passámos na nossa nova casinha :)

09 junho 2006

dias assim

em que a equação é = (trabalho X stress) elevado a preocupações, só há uma saída:
programas de televisão sobre a natureza, de preferência sobre um qualquer mamífero marinho residente nas regiões polares, com muitas imagens de branco, azul e silêncio.

07 junho 2006

estrangeiros

Toda esta confusão à volta da reportagem sobre a extrema-direita em Portugal tem gerado muitas conversas pelo meu gabinete e algumas surpresas. Quase todos os meus colegas têm origens miscegenadas - inglesas, judaicas, brasileiras, angolanas, japonesas, chinesas, you name it - o que não só enriquece as nossas conversas como nos leva a ver as coisas de perspectivas bem diferentes.
Hoje revelaram-me que se sentem estranjeiros em qualquer lado. Fiquei de boca aberta (será que é muita ingenuidade minha?). Eu sentia-me estranjeira quando vivia na Alemanha mas, aterrando no Aeroporto da Portela, estava na minha terra.
Como é que pessoas que nasceram e viveram em Portugal, sem estarem fechados em nenhum tipo de gueto, que torcem pela Selecção Nacional e se riem das mesmas piadas, se podem sentir estrangeiras? Como é que podem mesmo sentir receio que os movimentos de extrema-direira ganhem tanta força que isso possa ter implicações directas na vida deles?
Às vezes acho que o facto de haver tantos filmes sobre o racismo, a intolerância, o Holocausto tem o mesmo efeito das reportagens diárias sobre a guerra no Médio Oriente: transforma a realidade em espectáculo e dessensibiliza-nos.

06 junho 2006

girls just wanna have fun

No auge da minha entrolhização, resultado de dias a fio de transporte de tábuas, pinturas e montagens, que me deixaram as pernas cheias de nódoas negras, os braços arranhados, as unhas pretas e o cabelo com tinta branca que teima em sair, surgiu a M., para me salvar. A M. é a minha prima de Barcelos, 5 anos mais nova que eu, que veio viver para minha casa durante os 3 meses que dura o estágio que veio fazer para Lisboa.
Como estava a precisar de uma companhia feminina, com quem trocar futilidades sobre cortes de cabelo e ver as maravilhosas séries da Fox, horas a fio! Para quem, como eu, nunca teve uma irmãzinha a quem pintar as unhas com canetas de feltro e trocar roupas, isto é uma maravilha. E a salvação do que me restava de feminilidade. Abençoada sejas M.!

05 junho 2006

já chega

Se monto mais um móvel trönga trönga, mais uma prateleira grölit, mais um parafuso que seja, dou em louca! Já sonho com dobradiças, acordo a pensar em fitas-métricas! Algum homem giro, inteligente, rico mas sobretudo com uma casa maravilhosa e já completamente pronta por aí?

01 junho 2006

dia da criança

Não, não vou dizer mal do dia da criança. Mas este sempre foi um dia negro para mim porque nunca recebi 1

nem 1 só

presente no dia da criança.
Os meus pais discordavam do sentido comercial da coisa, que o "dia da criança é todos os dias", e mainada!
Isto, a juntar ao facto de nunca ter podido usar cuecas com bonequinhos para mostrar às amigas quando íamos à casa-de-banho no infantário, à repressão extrema que exerceram sobre as minhas barbies, ao facto de ter tido o cabelo curto ao longo de grande parte da infância e, pior, não ter tido autorização para ver os Simpsons quando começaram a dar cá (andava eu no saudoso 1º ano do ciclo preparatório), explica todas as minhas psicoses de incapacidade de identificação com a espécie feminina humana, restando-me, por alongado contacto com os animais, identificar-me com as gralhas. Depois admiram-se.