A verdade é que cresci com medo da revolução. Todas as
células do meu corpo anseiam pela ordem e previsibilidade. Em minha casa, na infância,
não passava Zeca Afonso nem Sérgio Godinho. Abril era o mês de muitos
aniversários, até do meu, mas nunca foi sinónimo de libertação. O 25 era de
novembro. O vermelho, encarnado. A reforma, pensão. Revolucionar o pensamento,
transfigurar a reação ao que significa reação pode ser, e foi no meu caso, um
processo retardatário que ainda está em curso. Podia dizer que foi um amigo, um
momento, uma situação em particular que fizeram o clique e me abriram os olhos
à necessidade absoluta de revolução, mas até isso foi progressivo. Para sermos
revolucionários, temos de estar desesperados ou ser extremamente generosos com
os que não têm as mesmas vantagens que nós. Precisei de cultivar essa
generosidade com a escuta atenta à ausência – de direitos, de voz, de
oportunidades – porque os gritos e as reivindicações podem ter o efeito oposto
ao pretendido. Se calhar é por isso que sei que a revolução de agora tem de ser diferente das outras, porque os mesmos de sempre já estão
convencidos. Confio no poder da arte e do humor, só alguma coisa que nos apanha
desprevenidos consegue fazer-nos mudar de ideias. Estou disposta a pintar
cartazes, a dar coro a novos hinos e a fazer todas as figuras tontas que
ajudarem a desfazer o siso instalado. Mas eu sozinha não consigo. Onde e quando
nos encontramos?
12 setembro 2025
Revolução
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