12 setembro 2025

Revolução

A verdade é que cresci com medo da revolução. Todas as células do meu corpo anseiam pela ordem e previsibilidade. Em minha casa, na infância, não passava Zeca Afonso nem Sérgio Godinho. Abril era o mês de muitos aniversários, até do meu, mas nunca foi sinónimo de libertação. O 25 era de novembro. O vermelho, encarnado. A reforma, pensão. Revolucionar o pensamento, transfigurar a reação ao que significa reação pode ser, e foi no meu caso, um processo retardatário que ainda está em curso. Podia dizer que foi um amigo, um momento, uma situação em particular que fizeram o clique e me abriram os olhos à necessidade absoluta de revolução, mas até isso foi progressivo. Para sermos revolucionários, temos de estar desesperados ou ser extremamente generosos com os que não têm as mesmas vantagens que nós. Precisei de cultivar essa generosidade com a escuta atenta à ausência – de direitos, de voz, de oportunidades – porque os gritos e as reivindicações podem ter o efeito oposto ao pretendido. Se calhar é por isso que sei que a revolução de agora tem de ser diferente das outras, porque os mesmos de sempre já estão convencidos. Confio no poder da arte e do humor, só alguma coisa que nos apanha desprevenidos consegue fazer-nos mudar de ideias. Estou disposta a pintar cartazes, a dar coro a novos hinos e a fazer todas as figuras tontas que ajudarem a desfazer o siso instalado. Mas eu sozinha não consigo. Onde e quando nos encontramos?


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