É mais difícil acertar no ponto do caramelo, agora que estraguei o termómetro de cozinha, mas continuo a prepará-lo de cada vez que terminamos uma temporada de uma das séries que vemos em família. Requer paciência, raspar os grãos de açúcar que ficaram acima da linha de água, no tacho, ir mexendo sem perturbar a superfície até chegar à altura de juntar a manteiga, o sal e as natas frias (uso iogurte grego). Criei esta tradição do caramelo porque sou gulosa e porque acabo por inventar trabalho na cozinha, apesar da minha parca domesticidade. Nem sequer tenho assim tanto amor à rotina. Preciso que estas coisas pequenas, mas previsíveis, ocupem espaço na história da minha família. Não quero correr o risco de olhar para trás e ver só divórcio, confinamentos, doenças, mortes, os fantasmas da quase guerra. Se calhar é por ler demasiados romances que não consigo
não ter uma noção de narrativa do dia-a-dia. Cada vez me interesso menos pelo que não é ficção. Faço caramelo salgado para cobrir pipocas e sento-me no chão da sala enquanto os de sempre lutam pelo canto do sofá. Nessa altura, está tudo no seu lugar. No filme 'Adaptation', que vi recentemente, um guru do guinismo alertava contra as histórias sem drama e resolução. Pois sim, este é o meu enredo e será tão previsível e sem sobressaltos quanto estiver nas minhas mãos.
As outras doçuras:
Apanhada na curva
A Gata Christie
Boas intenções
Dois dedos de conversa
O blogue azul-turquesa
Panados e arroz de tomate
Quinta da Cruz da Pedra
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