13 janeiro 2015

mais vale pecar por excesso

Ontem só soube de uma situação grave acontecida na escola do meu filho mais velho porque a professora o instruiu para ir contar aos pais. Mesmo assim ele começou o relato com "desculpa, sei que não gostas que conte estas coisas mas...". Foi uma coisa realmente séria, podia ter tido consequências graves e nós, pais, teremos de intervir. O meu coração gelou quando pensei que ele podia não me ter contado. Quando pensou que eu preferia não saber.
Já lhe tenho dito que não gosto de queixinhas.
Não gosto. E um irmão mais velho tem muita ocasião de fazer queixinhas.
Mas como é que ele não vê a diferença abissal entre dizer-me o que se passa, que tem a ver com a segurança dele, e o blá, blá, blá inconsequente?
Não interessa. Não vê. E não interessa se não vê. O que interessa é que ele tem urgentemente de perceber que pode - deve - contar-me. Paciência para o resto. Espero que tenha percebido, depois da conversa que tivemos.
É muito complicado lidar com um filho que investe tanta energia em agradar aos pais. Mais do que tentar desconstruir o meu aparente perfeccionismo e reforçar o nosso amor incondicional, a toda a hora, por tudo e por nada, na verdade, não sei o que fazer.

11 comentários:

Ana disse...

Compreendo-te perfeitamente. Quando entrei para o 2ºciclo um grupo de 4 ou 5 rapazes adolescentes apanhou-me na rua. Eu já fazia o caminho a pé para casa sozinha e não os conhecia de lado nenhum. Fizeram uma roda à minha volta e tentaram enfiar-me à força um cigarro na boca. Não me fizeram mal, mas estavam a aproveitar-se da minha vulnerabilidade para gozarem um pouco comigo. Eu consegui escapar e corri como nunca. Mas depois de chegar a casa, não fui capaz de contar. O mais estúpido é que senti vergonha, lembro-me do sentimento. Acontece que fiquei tão assustada que quando fui para o meu quarto comecei a chorar e o meu irmão "apanhou-me". Ficou preocupado, disse aos meus pais e não descansaram enquanto eu não contasse. Isso fez-me pensar bastante, já em adulta. Porque não contei? E se tivesse sido algo realmente grave como um abuso sexual? Lá está, provavelmente eles saberiam porque sou muito transparente emocionalmente e não conseguiria esconder, mas por minha iniciativa, se aquilo me fez sentir vergonha, algo assim muito mais. No meu caso, acho que é porque houve sempre uma clara separação entre a minha vida lá fora e a minha vida familiar. Os meus pais não eram austeros mas também não promoviam o diálogo. Era como se houvesse uma clara separação na minha cabeça entre casa e escola/amigos.
No teu caso certamente que encontrarás a melhor forma de chegar a eles, mas tendo sempre em mente que haverá sempre coisas que eles não nos vão contar, por mais absurdas que nos pareçam. Quem sabe este episódio ajudará a que ele entenda melhor a separação entre umas queixinhas e outras. É dificil também não ficarmos zangados com estas coisas, pelo choque, mas penso que se mostramos muito a zanga, eles reforçam a ideia de que mais vale não contar (ainda que possa ser ilógico porque se contasse não se zangariam, mas de facto nem sempre é previsivel para eles qual será a nossa reacção. O meu marido não contava nada aos pais porque sempre que o fazia, eles faziam sempre algum reparo da forma como ele deveria ter agido de como deveria ter feito etc. Ele sentia sempre que acabava por ser julgado, quando a intenção dos pais era a de o ajudar. Enfim, a comunicação nem sempre é uma coisa fácil, mas vamos aprendendo com eles e vice versa. Um beijinho*

gralha disse...

Obrigada, Mãe Sabichona.
Pois, suponho que o que podemos fazer é ir falando, ouvindo, falando, ouvindo, até alguma coisa de importante sair espontaneamente. E é bom, no nosso caso, haver um pai e uma mãe bastante diferentes: um apanha umas coisas, outro outras. Enfim...

Pisco disse...

No 2º ciclo fui parar a uma turma horrível. Não só horrível em termos de comportamento nas aulas, mas também nas relações entre colegas.
Sendo a única boa aluna da turma, tornei-me, obviamente, o alvo. Não me lembro de um único dia, nesses 2 anos, em que não tivesse de me defender. No entanto, o mais bizarro é que nunca achei que aquilo não fosse normal. Na minha cabeça, formou-se a convicção de que "a vida agora era mesmo assim". A felicidade do 1º ciclo era uma quase que já tinha passado e agora a vida era assim e o melhor era adaptar-me. Ora, sendo tudo normal e parte da vida, nunca contei aos meus pais o que se passava.
Só quando mudei de escola, no 7º ano, e fiquei numa turma de miúdos como eu, que não batiam, que não insultavam, que gostavam (pasme-se!) de ler e de ver os mesmo filmes que eu, é que percebi que afinal nada do que passara era normal. E só aí contei tudo aos meus pais, que, coitados, iam tendo um ataque de nervos.
Esta experiência faz-me agora estar muito atenta ao que se passa com o meu filho, que, tal como o teu, acha que tem de ser perfeito. E que tem de aguentar tudo, como eu achava quando tinha 10 anos. Até já lhe contei a minha história. Não para o assustar, mas para o fazer perceber que vale sempre a pena conversar com os pais.
Se vai resultar? Não faço ideia...

Amigo Imaginário disse...

À medida que eles vão crescendo, nota-se que o diálogo que estabelecem connosco também muda. Começam a conhecer um outro lado de nós de forma mais consciente. E a perceber melhor o nosso funcionamento cerebral, por assim dizer. Custa um bocadinho esperar por essa fase, admito.

Por outro lado, penso que há sinais de alarme que temos mesmo de lhes passar. Durante os longos anos em que o Diogo andou no hóquei, principalmente a partir do momento em que as mães foram banidas dos balneários, eu morria de medo que ele não percebesse que sob a capa de "camaradagem masculina" entre miúdos e pais e avôs e treinadores, muita coisa estranha podia acontecer...

gralha disse...

Quando me encontrares, agora que falas nisso, também não contava aos meus pais quando havia miúdas a chatear-me na escola. Suspiro. Crie-se o ambiente de diálogo, como diz a Mãe Sabichona, e espere-se o melhor.

Amigo Imaginário, a verdade é que eles não vivem numa redoma. Estejamos atentos aos sinais de alarme.

Melissa disse...

Eu gosto de queixinhas. :/ Ora digo "caga nisso", ora não. Mas encorajo-as. Tenho muito a crescer como mãe, talvez mais do que ele como filho.

gralha disse...

Não gosto de queixinhas mas que se lixe, Melissa. Já lhes disse que façam as queixinhas todas que tiverem a fazer. Quando forem mais crescidos logo perceberão a diferença.

Naná disse...

Assusta-me saber que um filho meu não se sente à vontade para contar o que se passa na escola...

O Filipe por exemplo, apanhava dos outros miúdos e não só não se defendia como não dizia nada a ninguém, nem na escola nem em casa... às vezes lá se escapulia e eu ficava de coração apertado... e pensava comigo, se ele em pequeno não é capaz de me contar as coisas, como será na adolescência, que é a idade dos segredos...

gralha disse...

Naná, pois, uma pessoa sente-se muito impotente. É do caraças. Não vou começar já a preocupar-me com a adolescência, não vale a pena morrer de véspera.

calita disse...

Eu acho que "não gostar de queixinhas" é um bom princípio.
O teu filho não distinguir entre queixinhas e queixas graves, também me parece normal, ainda é muito pequeno, apesar de não parecer.
Já pensaste que o problema pode ser muito mais grave para ti do que para ele? (espero que seja o caso, não faço ideia do que se trata).
Seja como for, nunca nos livramos da ferida do coração dilacerado quando supomos/sabemos que sofrem.

gralha disse...

Infelizmente foi mesmo grave, objectivamente, calita. Já tomámos as medidas necessárias, vamos ver no que dá.