Só há uma coisa mais cansativa que viver: é (tentar) cumprir projectos de vida. Nunca me hei de esquecer da aula de História em que a nossa fabulosa professora falava dos primeiros filósofos gregos, justificando a disponibilidade que tinham para se sentarem a pensar com a segurança material que aquela civilização tinha conquistado. Lembro-me disso sempre que me ponho a matutar em qualquer coisa em vez de ir mas é fazer o jantar ou pegar num livro. Não dura mais que uns segundos. Confesso-me uma primitiva incognoscente, mesmo que não tenha mais nada para fazer, evito pensar na vida e estruturar grandes planos para o futuro.
É que é só a mim que os grandes projectos parecem uma forma ingénua de enfrentar um amanhã que é bastante incerto? Até posso decidir que vou tirar aquele curso, investir naquela relação, dedicar-me a um desporto, e depois bate tudo ao lado. Se calhar, ainda bem. Tentar fixar um certo futuro é tão palerma como procurar agarrar o passado. E as frustrações e desilusões que daí advêm? Não é que não devamos acreditar que podem vir daí coisas muito boas, que não tentemos esforçar-nos por fazer o melhor possível naquilo em que nos envolvemos, mas se calhar mais valia estarmos um bocado sossegados e lidar com o que vai surgindo. Sem listas, sem esquemas, sem planos de contingência, sem nos transformarmos (e aos nossos filhos, como bem lembra a Calita) em amontoados de projectos e árvores de prioridades. Não sei, é uma ideia. Mas pode ser que seja mais preguiça do que outra coisa.
7 comentários:
Eu sou a rainha dos projectos. Milhares deles, que não passam disso. O R. tem tentado demonstrar-me que não se deve fazer tantos projectos, nem ficar à espera do que a vida nos traz. Devemos pensar e fazer. Ponto final.
Não vejo mal nenhum em sobreprojectar... vejo mal é na nossa incapacidade de reagir flexivelmente quando os projectos não nos correm de feição...
Falo por mim... projectizar a minha vida dá-me um certo sentido de orientação, de rumo... aprendi foi com a idade (está visto que estou a ficar cota!) a encarar os desvios da projectização de uma forma mais zen...
O problema é vivermos a nossa vida em função do futuro. Tem, de certeza, a ver com a sobrevivência da espécie. Educamos os nossos filhos para serem adultos assim e assado. Estudamos para ter a profissão tal e tal. Poupamos dinheiro (ahahahahahahahahahahaha, quem me dera) para uma eventualidade, ou para qualquer outra coisa que esperamos ter no futuro. Enfim, acho que esta é forma de os humanos conseguirem lidar com a existência. E uns conseguem fazê-lo muito melhor do que outros.
É claro que temos de ir fazendo projectos - sobretudo os concretizáveis - isto era mais um desabafo acerca da sobrecarga que implica termos a vida toda programada. Por muito que isso nos dê sentido de rumo (a mim também dá, é isso e fazer a cama todas as manhãs).
Mas tu fazes a cama todas as manhãs? Ahahahahahah!
Eu sou uma hipócrita que ensina os filhos a fazer as deles e depois não TENHO TEMPO para fazer a minha!
O Luís faz as camas todas as manhãs. Não ponho os miúdos a fazer porque é beliche e tenho medo que caiam lá de cima. Faço questão de ter as camas feitas porque isso é mesmo importante para sentir alguma ordem na minha vida. Também tento arrumar a casa todos os dias (sim, incluindo brinquedos). Não funciono bem no caos (mas nunca digam isso às minhas entidades patronais).
Eu já tive projectos megalómanos, tipo para uma vida inteira... e, depois, percebi que a vida trata de nos tirar o tapete debaixo dos pés quando achamos que sabemos tudo. Porque a sobreprojectização muitas vezes faz-nos só olhar para a meta e esquecer que o importante é o caminho.
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